sábado, 27 de dezembro de 2008

A inteligência e o poder estragam as mulheres?

Seria a inteligência um atributo masculino? Segundo o filósofo Immanuel Kant, a mulher poderia chegar a ter inteligência, contudo, com isso ela despertaria apenas respeito do homem, mas não mais seu amor e perderia todo o poder que ela poderia ter sobre o sexo forte. Tal é dito no texto Observações sobre o sentimento do belo e do sublime.[1] O esforço na Ciência é sublime, pesado, portanto é masculino; o sexo feminino é belo, leve, ele apraz imediatamente. O enorme esforço para entender Descartes, Leibniz, as equações de Newton desperta o sentimento do sublime, não do belo, por isso é contrário à natureza feminina. Elas poderiam se deixar levar por esta dura empreitada, contudo, perderiam aquilo que nelas agrada imediatamente, sua beleza e leveza:
“O estudo laborioso ou a especulação penosa, mesmo que uma mulher nisso se destaque, sufocam os traços que são próprios a seu sexo; e não obstante dela façam, por sua singularidade, objeto de uma fria admiração, ao mesmo tempo enfraquecem os estímulos por meio dos quais exerce seu grande poder sobre o outro sexo.”[2]
Kant vai se referir a algumas mulheres do século XVIII que ousaram adentrar em campos do conhecimento considerados masculinos: Anne Dacier ( 1654-1720) comentou e traduziu clássicos grego-romanos e Gabrielle Emilie (1704-1749), marquesa de Châtelet intimamente ligada a Voltaire, traduziu e comentou os Principia de Newton:
“A uma mulher que tenha a cabeça entulhada de grego, como a senhora Dacier, ou que trave profundas discussões sobre mecânica, como a Marquesa de Châtelet só pode mesmo faltar uma barba, pois com esta talvez consigam exprimir melhor o ar de profundidade a que aspiram”.[3]
Para amar alguém, precisamos nos sentir superior a tal pessoa: “Nós precisamos mais ser honrados do que amados, mas nós também precisamos algo para amar com que não estejamos em rivalidade. Então amamos pássaros, cachorros ou uma pessoa jovem, inconstante e querida.” (R 1471, 15:649).

Teria Kant ainda razão? A pergunta “Seria a inteligência um atributo masculino?” se transformaria em “queremos ser inteligentes e despertar apenas o respeito masculino e não mais seu amor”? A inteligência “estraga” as mulheres?
Poder e inteligência são tradicionalmente atributos eróticos masculinos e beleza e juventude atributos eróticos femininos.
Talvez alguns se lembrem ou tenham visto documentário sobre a tentativa de Henry Kissinger aproximar-se da China comunista. Numa histórica reunião entre o então presidente Mao Tse Tung e Henry Kissinger, para quebrar o gelo daquela que devia ser uma das mais tensas reuniões da política do século XX, Mao Tse Tung arriscou uma primeira pergunta a Henry Kissinger. Como ele, sendo tão gordo, fazia tanto sucesso com as mulheres? Ao que ele respondeu com a famosa frase: o poder é afrodisíaco.
Assim como Kant, Kissinger também sabia que o poder era afrodisíaco, desde que fosse um atributo masculino. O poder e o saber são afrodisíacos, enquanto propriedades do homem. Isso pode ser tomado em dois sentidos: as mulheres são atraídas por homens que possuem tais qualidades, sem dúvida. Mas existe um outro sentido, inexplorado nesta afirmação de Henry Kissinger: os homens gozam o próprio espetáculo narcísico de exibição de seu poder e saber, espetáculo que excita, antes de tudo, a eles próprios. O espetáculo de inteligência feminina roubaria a cena e tornaria aquele contato anti-erótico.
[1] Kant, Observações sobre o belo e o sublime (Campinas: Papirus, 2000).
[2] Ibid., p. 49
[3] Ibid. p. 49
[4] Ibid. p. 25

Nenhum comentário: